quinta-feira, 21 de fevereiro de 2019

Resignação

...
Por que a poesia foge quando vivo sobre a ameaça de você entrar pela porta que insisto em deixar aberta?
E por que não me lembro dela nem da porta quando você aparece para curar a dor de criá-la?
Sem saber se é bom ou ruim?
Queimei minha pele morta na brasa daquele cigarro
Tentando evaporar o álcool que absorvi na última esquina aberta dessa cidade
Dançando com a fumaça do corpo dele num soneto composto pela solidão escondida entre as rosas que você espalhou pela casa, negligenciando poemas que nunca leu nem nunca vai ler
Enquanto rouba o espaço que eu tinha para chorar
e me poupa de enxugar a cerveja da mesa
Na incongruência da mistura de minhas próprias incertezas e resignações

sábado, 16 de fevereiro de 2019

Outra noite nenhuma

Outro silêncio na vibração da caixa de som
Outra insensatez de meus sentidos dúbios
Outra noite de bar
Outro movimento automático de gritar com garçons pra depois acordar e estender os lençóis amarrotados pelos mesmos movimentos parilhados com aquele que escolhi levar pra casa apenas para disfarçar o fim...
Outra vez meus pés formigando
enquanto meus dedos acariciam voluptuosamente a mesa de madeira que nem é minha
mas que me faz companhia depois de dispensar todos de qualquer compromisso

Meu termostato pirou
e consigo sentir calor nas gotas suadas do copo de cerveja
nas minhas palavras perdidas
nas promessas insólitas que me sustentam enquanto estou sóbria 
e enquanto não estou...
nas espera de quem não vai voltar do outro lado do mar ou do véu da morte
E no medo de não saber onde fica o fim..

Em temer e amar a solidão
Em temer a geladeira vazia de cerveja e fubá
Em temer, por simplesmente não saber como é dividir algum medo
Dividir a lavagem da roupa de cama, o fubá e a breja
Ou um final de mês...

Às vezes só queria morar num livro
do velho Buk ou de Jane, ou de Emily Bronte, 
ou apenas ser Pessoa e morrer enfim..

Mas eu ainda não morri

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2019

Todo dia vira vício

Brindo à madrugada com a pia limpa
No compasso sonoro dos maxilares das duas companheiras que agradecem meu regresso às suas respectivas travessas plásticas
Na sonata do vento chacoalhando as roupas sujas e esquecidas no varal que volta e meia sucumbe ao peso de tantos figurinos
No estalo do gelo na bacia da água que suaviza essas terras quentes nas quais sempre plantei
No limão borbulhando no céu da minha boca seca de um beijo seu..

Brindo à manhã que não demora a me exigir nervosa
Aos pingos refrescantemente musicais no concreto
À minha ausência teimosa de fim..
Ao silêncio de casa onde fotos e bilhetes se exibem para paredes resignadas de distância

Todo dia vira vício
Por isso prefiro dizer ao nada aquilo que eu lhe diria com a língua muda e ácida
Com as baforadas de meus pulmões contraídos
Com os movimentos apudorados de meus rins..

Minhas pernas também lhe diriam muito
Se voce se aproximasse para que lhe abraçassem com a firmeza de uma bailarina manca
Ou se deixasse meu dinheiro lhe falar em tom surdo tudo o que suei
Pra no fim eu não dizer absolutamente nada, tampouco ouvir você ou quem seja
Pois me tornei adcta da necessidade de ser ouvida
E refém da minha própria imaginação